20111205

Todos merecemos saber o que pensam do nosso trabalho

Alguns anos atrás fiz um trato com um colega colunista. Se ele começasse a achar que meu trabalho estava indo ladeira abaixo, me chamaria de lado e diria isso. Do mesmo modo, se eu achasse que estava havendo uma queda no padrão de qualidade de suas colunas, faria o mesmo por ele.

O motivo de tal acerto entre colegas parecer necessário é que nem sempre você pode confiar em seu patrão para lhe dizer certas verdades duras. A maneira como o sistema funciona na maior parte dos países é que não há sinais de que você não está se saindo bem, especialmente quando você sobe na hierarquia. Você só descobre quando já é tarde.

Até agora, nenhum de nós foi chamado em um canto para tomar conhecimento da verdade incômoda. Mas agora parece que nunca vamos precisar saber. O governo do Reino Unido disse recentemente que pretende mudar as regras que tornam mais fácil para os empregadores dizer às pessoas que elas não estão rendendo o esperado. Meu chefe poderá me convocar para uma "conversa reservada" e me dizer o quanto meu desempenho está ruim, sem medo de eu responder pegando o telefone e ligando para meu advogado.

Os sindicatos, é claro, odeiam a ideia. Eles afirmam que vai ficar mais fácil demitir as pessoas num momento em que a ênfase deveria estar na criação de empregos e não na eliminação deles. Mas, em tese, ela me parece um plano excelente - embora na prática possa não fazer muita diferença. Conversas reservadas deveriam ser boas para os patrões por que poderiam tornar mais fácil para eles lidar com os funcionários de desempenho mais fraco, mas elas também deveriam ser boas para os trabalhadores.

Uma das coisas mais importantes que você precisa enquanto empregado é saber onde você se encaixa. Você pode pensar que isso é uma coisa que todo mundo sabe ou tem noção. Mas pela experiência que tenho, apesar de todo o ritual sem sentido das avaliações anuais, isso é algo que a maioria das pessoas pouco conhece. E se você é o chefe, você tem menos ideia ainda, uma vez que quanto mais alto você está na hierarquia, menos as pessoas estão preparadas para lhe dizer a verdade.

David Cameron sugeriu que essas conversas reservadas podem funcionar nos dois sentidos, podendo ser iniciadas pelo chefe ou pelo funcionário. Suponho que isso significa que você poderia convocar seu chefe e dizer, sem medo de ser demitido: "Acho que seu estilo de liderança não está funcionando. Será que não é a hora de você procurar outro emprego?" Isso parece excelente, mas há um problema aí: não vai acontecer nem em um milhão de anos, independentemente de eventuais mudanças nas regras. E essas conversas sinceras também não ocorrerão na via normal, em que o chefe faz a convocação para a conversa.

Conversas sinceras raramente acontecem no trabalho por vários motivos - e o medo da lei e das recriminações estão lá para o fim da lista. Não somos sinceros principalmente por que é muito mais fácil não ser. Dizer a alguém que essa pessoa é inútil é uma coisa terrível de ser feita porque vai magoar essa pessoa e você vai se sentir um monstro.

Além do mais, a própria ideia de uma "conversa reservada" é uma coisa sem sentido. Isso porque, como as pessoas têm memória, todas as conversas desagradáveis têm uma maneira de se enraizar para sempre na cabeça, afetando seu comportamento por muito tempo. O que se precisa não é de um sistema de conversas reservadas. Mas um par adequado de cursos rápidos que todos deveriam fazer. O primeiro seria chamado de "Falando a coisa como ela é"; e o segundo, "Enfrentando a situação com coragem".

Conversas sinceras do tipo podem ser muito boas. Quando tinha 16 anos, minha filha deixou a escola feminina e foi fazer o sexto ano ginasial em uma escola predominantemente masculina. Ela estava acostumada a ter todos os deveres de casa devolvidos com comentários encorajadores e assim, quando sua primeira redação sobre história voltou com a nota D/E -ou DIE (morra), conforme os meninos chamavam-, ela teve um grande choque.

Lágrimas foram derramadas, mas ela se esforçou para ter melhores resultados posteriormente. A maioria dos trabalhadores profissionais precisa do tratamento DIE. Precisamos ser informados de maneira clara quando nosso trabalho não está bom. Precisamos ser informados disso não na última hora, e sim na primeira. E em todas as horas depois dela. Isso não é algo que uma mexida na burocracia vai proporcionar.

Isso significa que o acordo informal que fiz com meu colega ainda vale? Ao escrever esta coluna percebi uma coisa. O trato não se sustenta: nunca se sustentou. Se a coluna de meu colega deixar de ser boa, tenho certeza de que não terei coragem de dizer isso a ele. E não sinto muito consolo no fato de que até agora ele também não fez isso. O silêncio não significa nada. Ele seguirá indefinidamente, uma vez que nenhum de nós estará disposto a dizer DIE. Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times".

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