20120131

Investimento pessoal

Em 2006, aos 32 anos, o paulistano Ricardo Kahn decidiu apostar todas as fichas na realização de um MBA de ponta como marco de uma nova fase na trajetória profissional. Formado em economia, ele planejava iniciar carreira como executivo na área de finanças, mas até então só tinha atuado como dono de negócio - trabalhara alguns anos na revendedora de autopeças da família e depois como sócio de um haras, do qual decidira se desligar. Investigou as possibilidades do mercado e optou pelo MBA executivo do Insper.

Graças à eficiência da rede de contatos estabelecida com colegas e professores, mérito sobretudo da facilidade para se relacionar, Kahn trocou duas vezes de emprego durante os dois anos do curso. Saiu contratado por uma multinacional sueca na área de intercâmbios e idiomas, a Education First, com a missão de reestruturar os departamentos financeiros nas subsidiárias do Brasil, Argentina, Chile e Venezuela - país onde passou oito meses no ano passado.

De volta ao Brasil, ele percebe claramente que entrou de vez no mercado, já que sondagens e propostas se tornaram frequentes - muitas delas originadas direta ou indiretamente dos colegas do Insper, com os quais mantém contato e se confraterniza pelo menos uma vez por ano. "Eu não tinha um currículo vistoso nem havia me formado numa instituição de ponta, e o curso me fez superar essas dificuldades. Valeu cada centavo do investimento", diz ele, referindo-se aos R$ 50 mil aplicados.

A história de Kahn simboliza uma tendência que atinge o mercado como um todo, com reflexos diretos nas escolas de negócios: a valorização das chamadas soft skills, o conjunto de habilidades relacionadas ao comportamento e à forma de se relacionar com as outras pessoas.

Caso tivesse se candidatado ao MBA dez anos antes, é provável que, com sua trajetória tão fora do comum, Kahn sequer fosse selecionado. "A princípio eu achei que ficaria de fora, mas depois percebi que foram justamente as minhas peculiaridades que me tornaram interessante para a instituição, os colegas e até mesmo os professores", descreve.

Esse mesmo movimento tem levado a uma certa relativização da importância dada a atributos objetivos. Difunde-se cada vez mais no mercado, inclusive como critério de seleção de trainees, o entendimento de que um diploma concedido por instituição de ponta ou domínio perfeito do inglês não são mais suficientes para "salvar" um profissional que demonstra falhas de comportamento ou se mostra incapaz de se relacionar adequadamente com colegas, subordinados e superiores.

"Essa é uma demanda que vem das empresas, cada vez mais interessadas em ter profissionais preparados não apenas tecnicamente, mas também do ponto de vista humano", diz Sandra Finardi, diretora da consultoria DM Executivos. Uma das consequências é que se passou a esperar das escolas de negócios um papel mais ativo na orientação de carreira dos alunos - muitas começaram a oferecer o serviço adicional de coaching, por exemplo.

A contratação de professores que associem experiência no mundo corporativo com formação na área de humanas, para liderar disciplinas ligadas a comportamento, interrelacionamento e autoconhecimento, também tem aumentado. O fenômeno ganhou impulso especialmente depois da crise financeira global de 2008, quando executivos de grandes empresas foram acusados de ignorar princípios de ética para assegurar bônus polpudos.

Enquanto muitas empresas passaram a dar mais peso às características comportamentais na avaliação de desempenho de seus colaboradores, as escolas de negócios começam a desenvolver metodologias para mensurar a eficácia dos seus cursos diante desses novos paradigmas. Afinal, como comprovar matematicamente que um profissional se tornou "mais humano"?

Instituições de ponta ao redor do mundo, e também no Brasil, estão criando estruturas de gestão do processo de aprendizagem, em que especialistas em ciências cognitivas trabalham em conjunto com estatísticos no desafio de desenvolver mecanismos de medição da evolução individual em aspectos ligados ao comportamento.

A necessidade de encontrar o tom certo entre a realidade objetiva e uma visão mais holística do mundo empresarial é apenas um dos desafios à frente das escolas de negócios. Para comprovar a relevância dos cursos que oferecem, essas instituições estão buscando retomar a interação constante com o universo corporativo - processo que, em certo momento, ficou um tanto comprometido pela valorização excessiva da visão acadêmica sobre os negócios.

"Houve uma fase em que o 'management' estava sendo tratado como uma ciência exata, quase do mesmo jeito que se trata matemática, química e física. Felizmente estamos novamente voltando as atenções à realidade do mercado, com todas os seus dilemas e contradições", diz o CEO do Ibmec, VanDick Silveira.

Como parte desse movimento, os tradicionais estudos de caso, que muitas vezes se limitavam a leituras e discussões teóricas sobre episódios do passado, estão se tornando cada vez mais interativos e práticos - os próprios alunos têm sido submetidos a problemas reais dentro das empresas, que se mostram mais abertas a esse tipo de intervenção. A nova tendência tem se refletido até na literatura executiva, em que frases de efeito e fórmulas prontas dão lugar cada vez mais a análises que levam em conta a complexidade do mercado atual e indicam caminhos efetivos de ação.

Uma das expectativas mais citadas por parte dos alunos de educação corporativa é justamente a possibilidade de aplicação prática do conteúdo absorvido em sala de aula. Ao planejar seus primeiros cursos de MBA, a HSM Educação, nova escola de negócios sediada em São Paulo, fez uma pesquisa com 350 executivos de alta gerência sobre os temas que consideravam relevantes atualmente. Os mais citados foram inovação, negociação, liderança de mudança, marketing em redes sociais e gestão do conhecimento. "São todos assuntos palpitantes e contemporâneos, evidência de quanto a educação executiva precisa evoluir no mesmo ritmo do mercado", diz o presidente da escola, Marcos Noll Barboza. Fonte Jornal Valor.

Narciso Machado

NCM Business Intelligence

Nenhum comentário: