20110222

Fale como um perdedor para poder se tronar um vencedor

Quando assisti Tim Armstrong na CNN falando sobre a genialidade da sua decisão de comprar o Huffington Post, constatei que não podia acreditar em uma palavra do que ele estava dizendo.
O executivo-chefe da AOL estava empoleirado num banquinho com Arianna Huffington ao seu lado discorrendo em linguagem brincalhona de internet sobre "criar experiências mágicas em torno de conteúdo" e explicando como todos estavam contentes. "A reação que recebemos sobre esse negócio foi impressionante", disse. "Provavelmente recebemos uns dois mil e-mails do mundo todo."
Meu problema a esse respeito não era o negócio em si, que pode se revelar muito proveitoso. Tampouco foi com a forma como os dois pareceram estranhamente artificiais nos seus banquinhos, com Armstrong parecendo um boneco Ken viril ante Huffington como uma Barbie inteligente.
Nem foi a linguagem, embora eu não pudesse deixar de pensar que, se ele realmente estava atrás de "experiências mágicas em torno de conteúdo", poderia ter se dado melhor com a Disney do que com um endereço na rede mundial de computadores que tenta nos contar o que está acontecendo no mundo.
Em vez disso, o motivo para a minha descrença foi que eu tinha acabado de assistir um videoclipe anterior no site da CNN de Armstrong descrevendo seu princípio orientador nos negócios. "Não permita conversas de perdedor", ele instou. "Não permita isso na sua organização. Fale sobre vencer. Fale sobre como você está levando as coisas adiante".
Considerando sua predileção pela conversa vencedora, não surpreende que ele tenha recebido dois mil votos de congratulações bajuladoras num espaço de poucas horas após o anúncio da transação. Na verdade, é o caso de se perguntar o que os demais 5 mil empregados da AOL estavam pensando ao não conseguirem disparar mensagens para seu executivo-chefe vencedor, dizendo "Parabéns! Gol de placa! Direto na caçapa!"
A insistência na conversa triunfalista não é apenas vulgar e antiquada, é também estúpida e perigosa. Abster-se de usar o negativo significa que metade da visão da pessoa está obscurecida - o que é desastroso nos negócios. A maioria das companhias, na maior parte do tempo, não vence. E quando elas estão efetivamente perdendo é uma boa ideia dizer isso de uma vez, para que ações corretivas possam ser tomadas.
A proibição de Armstrong a conversas de perdedor nem chegam a se qualificar como um artifício motivacional. A conversa de perdedor pode ser muito animadora se feita corretamente, mas pode também produzir o efeito contrário. Trabalhei para patrões entusiastas demais para os quais cada nova iniciativa era automaticamente considerada um triunfo grandioso, mesmo quando o resultado era ligeiramente capenga - ou um fracasso absoluto. Isso não fazia as pessoas se sentirem motivadas. Isso nos fazia sentir cínicos e constrangidos.
A conversa de perdedor, por outro lado, pode ser estimulante. No exato momento em que Armstrong estava no seu banquinho vencedor no estúdio de TV, um e-mail extraordinário escrito pelo executivo-chefe da Nokia estava sendo distribuído mundo afora.
Sua mensagem - explicando a gravidade dos problemas da companhia - era conversa de perdedor ao extremo. Foi também a melhor mensagem motivacional que já vi. Stephen Elop começou a sua nota com a história de um homem numa plataforma de petróleo em chamas que mergulha de uma altura de 30 metros para salvar a sua pele. "Nós também estamos numa plataforma em chamas", disse.
O medo da morte é motivador; o mesmo se aplica à verdade. A maioria dos empregados é alimentada com base numa perpétua dieta de abobrinhas, de modo que, quando são servidos com uma porção de duras verdades, o efeito pode ser reanimador.
O e-mail, com todo o seu horror, pode ser assimilado por alguns dias e então, na sexta-feira, veio outra mensagem. O mergulho salvador de vida ao mar era para ter sido um mergulho para se associar à Microsoft.
A nota de Elop não foi realmente inédita. Cinco anos atrás, Jihn Pluthero, presidente do conselho de administração da Cabel & Wireless, enviou uma mensagem semelhante a todos os funcionários. "Parabéns, trabalhamos para uma companhia com desempenho abaixo da média num setor abominável e ele se transformará num inferno pelos próximos 12 meses", escreveu. Essa versão britânica foi menos polida e ainda mais brutal que a de Elop, mas parece ter surtido efeito: a companhia está em melhor forma do que estava então.
Certamente, isso não significa que a conversa de perdedor sempre leve a melhor. O que é considerado certo depende das circunstâncias. A negativa, porém, tem um poder que falta à coisa positiva, que deriva do valor da sua escassez.
Falar dessa forma é algo raro, pois exige nervos de aço. Mesmo assim, antes que alguém se deixe arrebatar pela coragem de Pluthero e Elop, convém observar que ambos eram novos no cargo na época em que redigiram suas notas avassaladoras, portanto estavam meramente descrevendo o tipo de bagunça que seus antecessores deixaram.
O líder empresarial honesto e realmente corajoso - que ainda não existiu - será aquele que disser: estamos numa plataforma em chamas, e fui eu quem ateou o fogo.
Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times".

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