20110215

É muito fácil e divertido enganar banqueiros e headhunters

Recentemente, duas histórias circularam nos jornais sobre banqueiros que foram levados no bico por trapaceiros e malucos. As duas histórias são muito divertidas: ver banqueiros de investimentos atingidos por ovos é sempre motivo de euforia. Elas levantam dúvidas sobre o que os banqueiros fazem o dia todo e quais talentos são necessários para a boa realização desses trabalhos.
A primeira história envolve um britânico de 49 anos, que se candidatou ao cargo de vice-executivo-chefe de um banco da City de Londres. Seu currículo parecia excelente: Oxford, Harvard e depois 20 anos no JP Morgan. Durante duas entrevistas com headhunters e com o Ahli United Bank, Peter Gwinnell fez tudo diretinho e foi escolhido.
Trabalhou por um mês, período em que realizou muitas viagens e participou de muitas reuniões. Mas aí alguém resolveu investigá-lo. Descobriu-se que ele nunca trabalhou no JP Morgan e não estudou em Oxford ou Harvard. Na verdade, ele é um vigarista que já esteve na prisão e, depois de condenado por fraude, está agora sob a supervisão da Justiça e sob tratamento contra a depressão.
O interessante dessa história - além de fazer a gente imaginar o que os headhunters fazem para merecer as comissões enormes que ganham, se não se dão nem ao trabalho de fazer uma busca básica no Google -, é o quanto é fácil fazer as pessoas pensarem que você é um banqueiro importante.
É preciso simplesmente investir nas roupas certas e aprender o discurso correto. Gwinnell apareceu nos jornais com um visual totalmente plausível, com camisa azul de banqueiro e o perfeito terno cinza risca de giz. Embora o artigo que li não relatasse como ele falava nas reuniões, tudo o que ele precisava era falar de tal modo que ninguém mais pudesse entender o que ele estava dizendo. Assim, não importava se ele também não estava entendendo o que dizia.
A semana passada forneceu o exemplo perfeito do tipo de conversa exigido nos escalões mais altos dos bancos de investimentos. James Gorman, executivo-chefe do Morgan Stanley, deu uma entrevista ao "The Wall Street Journal", em que disse que "estamos concentrados menos na formação de um fluxo puro, em negócios induzidos pelos clientes... O que estamos fazendo estrategicamente é voltar para o futuro. Trata-se de um ponto ideal, onde nos sentimos muito confortáveis".
Qualquer vigarista deveria estudar intensamente um fluxo puro de pontos ideais.
A segunda história é menos dramática, uma vez que não envolve a Justiça, tratando-se apenas de um parágrafo escondido em um documento enviado à Securities and Exchange Commission (SEC) e descoberto por um jornalista perspicaz do "Houston Business Journal". No entanto, para mim ela é ainda mais eletrizante, uma vez que mostra o grande Goldman Sachs sendo feito de bobo por um sem-teto.
O banco, juntamente com a Greenhill & Co., vêm atuando para a Dynegy, a produtora de energia dos Estados Unidos que o investidor Carl Icahn está tentando comprar. Durante o processo de "go-shop" - em que os banqueiros tentam obter propostas maiores -, a Dynegy recebeu uma carta de uma empresa chamada Buisson Baudoin Rondeleux, demonstrando interesse na aquisição. Segundo o documento que deu entrada na SEC, a pessoa que assinou a carta "não respondeu a repetidas tentativas de contato telefônico e escrito feitas pelo Goldman Sachs e a Greenhill & Co.".
Finalmente, um banqueiro do Goldman a localizou e descobriu que a pessoa estava usando "um número de telefone de uma central telefônica de Columbia, na Carolina do Sul, e um endereço associado a um abrigo de sem-tetos". O documento então revela que a Buisson Baudoin Rondeleux "não apareceu em buscas de registros públicos feitos pela internet". Quando o banqueiro do Goldman finalmente conseguiu falar com o sem-teto, ele "indicou que não tinha financiamentos para a proposta em questão e não tinha nenhuma experiência anterior na aquisição de companhias de capital aberto".
Isso proporciona um vislumbre assustador do que acontece num departamento de fusões e aquisições. Os banqueiros, assim como os caça-talentos, ignoram o que o bom senso lhes diz. Mas, ao contrário de headhunters que não checam as coisas, eles fazem isso mal feito. Depois que são enganados, algum pobre criado documenta o que aconteceu para elucidação da SEC.
É lógico que qualquer impostor, ou sem-teto, teria feito melhor que isso. Eles dariam uma olhada no nome engraçado da companhia, passariam dois segundos no Google investigando e jogariam a carta na lata de lixo. Por outro lado, talvez os banqueiros tivessem certeza de que estavam perdendo seu tempo, mas como estavam sendo muito bem pagos, fizeram isso de bom grado.
Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times".

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