20120430

Adotar o inglês em equipes globais desmotiva quem não domina o idioma

É difícil imaginar Gina Qiao, a falante diretora de recursos humanos da Lenovo, ficar sem palavras. Mas quando sua empresa anunciou, depois da aquisição da divisão de computadores pessoais da IBM em 2005, que estava adotando o inglês como o idioma oficial da companhia, no lugar do mandarim, ela ficou muda. "Foi o momento mais difícil da minha vida", lembra ela em um inglês rápido e com sotaque, pontuado por eventuais colocações erradas e tempos verbais confusos. "Não conseguia me comunicar e expressar minhas ideias. Comecei a achar que não era tão esperta assim."

A sensação de frustração e perda de confiança que atingiu Gina é crescente no atual mercado de trabalho global, que escolheu o inglês como a língua oficial do intercâmbio internacional. Na medida em que administradores criam equipes que trabalham além das fronteiras nacionais, consolidam companhias que estão se fundindo e buscam meios de acelerar o compartilhamento de conhecimento, suas tentativas de impor um idioma comum em uma força de trabalho poliglota criam vencedores e perdedores.

Durante a transição de um idioma, profissionais bilíngues são sempre convocados para atuar como intermediários, unindo as sedes às operações locais, o que os coloca em uma posição privilegiada e pode levar a propostas de promoção. Mas para aqueles forçados a dominar um novo vocabulário e uma nova gramática apenas para manter o emprego, a mudança pode ser um passo profissional para trás.

"As empresas subestimam o estresse psicológico que a troca do idioma pode provocar", diz Rebecca Piekkari, professora de negócios internacionais da Aalto University da Finlândia. Em alguns casos, isso pode ocorrer porque alguns administradores que pertencem a elites cosmopolitas falam vários idiomas e assumem erradamente que seus subordinados também falam. Como exemplo, a professora Rebecca cita a fusão ocorrida em 1997 entre o Merita Bank da Finlândia e o Nordbanken da Suécia, que ela e seus colegas analisaram entrevistando funcionários.

Para ajudar na integração dos quadros, o presidente do conselho de administração da empresa finlandesa propôs que o idioma da companhia resultante da fusão fosse o sueco - que os finlandeses estudam na escola. Ele supôs (erradamente) que seus compatriotas falavam sueco tão bem quanto ele. O resultado foi que alguns finlandeses, com apenas o sueco enferrujado que haviam aprendido na escola, começaram a evitar situações em que temiam se passar por idiotas. Alguns ficavam calados nas reuniões, outros migraram de funções corporativas para a rede de agências onde se falava o finlandês e alguns foram para a concorrência.

Mas o problema acabou sendo resolvido. Depois de uma fusão com um banco dinamarquês em 2000, a instituição (hoje conhecida como Nordea) adotou o inglês como idioma oficial - o que pelo menos teve o efeito de colocar todos os funcionários escandinavos em pé de igualdade.

Uma maneira de os empregadores decidirem quanto do orçamento terão de reservar para o treinamento com o idioma é realizar uma auditoria de capacitação. O ideal, afirma Tsedal Neely, professora-assistente da Harvard Business School, é testar as pessoas para estabelecer "onde elas estão" e criar um ponto de partida para que progresso possa ser medido.

Ensinar o idioma no horário de trabalho e organizar grupos de estudo são medidas que podem ajudar a melhorar a confiança dos colaboradores. No entanto, as empresas também precisam reconhecer - e neutralizar - os preconceitos que podem influenciar sutilmente as promoções em favor dos candidatos que falam fluentemente o novo idioma, em vez dos mais competentes. Distinguir entre o conteúdo e o estilo é parte disso, afirma a professora Rebecca. Assim como respeitar os diferentes modos de comunicação.

Na chinesa Lenovo, Ken Batty, diretor executivo de recursos humanos para a Europa Ocidental, diz que os ex-funcionários da IBM tiveram que "aprender a ficar confortáveis com o silêncio". "O estilo chinês é muito cheio de pausas e pensamentos, o que pode ser interpretado pelos ocidentais como não entendimento."

Usar uma linguagem direta mostra consideração com os falantes não nativos. Thomas Balgheim, presidente-executivo da japonesa NTT Data para a Europa, Oriente Médio e África, Argentina e Brasil, observa que os faladores nativos do inglês tendem a usar expressões difíceis, além de falarem muito rápido. Para tornar os comunicados internos em inglês de sua companhia mais fáceis, ele pede a alemães e italianos que produzam o primeiro esboço porque eles empregam sentenças mais simples e usam um vocabulário que atende às necessidades de uma força de trabalho multicultural.

"Nosso idioma comum é o inglês, mas sem complicações", diz Balgheim, cujas experiências internas podem ser vistas como uma empreitada do tipo "faça você mesmo" com o "globish", o inglês simplificado voltado para pessoas que trabalham com negócios no mercado internacional, divulgado por Jean-Paul Nerrière, um ex-executivo da IBM. Gina Qiao percebeu que para manter a atenção das pessoas ela precisava entender inglês. "Se estou fazendo uma apresentação e alguém faz uma pergunta que eu não entendo, peço ao moderador que me ajude."

Mas e se os funcionários ficam apavorados a ponto de se desligarem mentalmente? Uma companhia que lida com a psicologia do aprendizado é a japonesa Rakuten, do setor de varejo. Nos últimos dois anos, a empresa mergulhou em um programa conhecido como "Englishnisation", para migrar do japonês para o inglês em 2012. Embora controverso - os funcionários realizam testes obrigatórios e não podem ser promovidos enquanto não atingirem o nível exigido -, ele usa técnicas de administração motivacional para garantir aos colaboradores com mais dificuldades que seus chefes confiam em sua capacidade. "Se as pessoas não atingem suas metas, elas continuam estudando", diz Koichi Noda, diretor de planejamento corporativo da Rakuten. "Meu papel é fazer eles acreditarem e persistirem", explica.

Será que as multinacionais ocidentais poderiam aprender com a "Englishnisation"? Como autora de um estudo envolvendo a Rakuten, a professora Tsedal Neeley, de Harvard, duvida que os ocidentais aceitassem métodos tão autoritários. Mas ela gosta da psicologia positiva. "Se alguém fica dizendo que 'você consegue', é surpreendente o quanto isso faz as pessoas pensarem 'talvez eu consiga mesmo'." (Tradução de Mario Zamarian) Fonte Financial Times.
Narciso Machado

NCM Business Intelligence








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