20110321

Um bilhete

Um bilhete escrito à mão é muito mais poderoso no trabalho.
Na semana passada, saí para comer uma pizza com um homem que há muito não via. A conta foi baixa e eu a paguei. Dois dias depois, um pequeno envelope creme estava em meu capacho. Dentro, havia um pedaço de papel dobrado no qual ele escreveu uma pequena nota, contando como havia gostado da ocasião.
Essa carta, que chegou na mesma entrega de correspondência com quatro propagandas e o extrato de cartão de crédito, me satisfez além da razão. Fiquei tocada a ponto de quase pegar minha caneta e escrever uma carta de agradecimento em resposta, para agradecê-lo pela sua.
Agradecimentos escritos à mão são tão eficientes como forma de fazer os outros se sentirem bem que é uma loucura o fato de ninguém mais escrevê-los. No último ano, acho que escrevi apenas um - e foi para agradecer minha sogra pelo pernil que ela sempre me manda no Natal. Tivesse ela computador, não acho que o teria mandado.
No escritório, o agradecimento escrito à mão é ainda mais poderoso e ainda menos usado. Cada vez que um funcionário faz um esforço especial, isso equivale a pagar uma pizza ou dar um pernil a seu empregador. Mas eles não esperam um "obrigado" por isso - o que é melhor assim, já que geralmente não o recebem. Às vezes, ganham um "obrigado" geral ("obrigado a todo nosso pessoal por sua dedicação irrestrita durante 2010"), mas tais declarações de gratidão amplas e brandas não têm efeito nenhum no moral.
Muito ocasionalmente, os chefes se prontificam a despejar um agradecimento individual cara a cara (o que é legal, mas se perde rapidamente) ou enviar um por e-mail (o que é mais legal, já que dura mais, embora seja um tanto insípido).
Uma pessoa que conhece o poder da nota de agradecimento é Doug Conant, que comanda a Campbell's Soup há dez anos. Recentemente, em blog da Harvard Business Review, o executivo disse que todos os dias passa algum tempo com um assistente esquadrinhando a empresa em busca de pessoas que merecem "obrigados" e, então, lhes escreve uma carta. Nos últimos dez anos, ele escreveu mais de 30 mil - mais de dez por dia.
Meu primeiro pensamento ao ler isso foi que o homem é um gênio. Meu segundo pensamento foi que ele é um idiota por ter revelado seu segredo e, portanto, desvalorizado sua moeda. Quem vai valorizar uma nota de agradecimento, quando se sabe que há mais 29.999 delas em circulação?
Quando li vários dos comentários emocionados deixados on-line por seus funcionários, no entanto, percebi que estava completamente errada. O agradecimento escrito à mão parece ser uma moeda que mantém seu valor. Cada carta, por definição, é escrita individualmente, portanto, não importa quantas outras existam. E, uma vez recebida, pode ser guardada na gaveta e ser lida até cair aos pedaços.
A carta de obrigado não é apenas incrivelmente eficiente. Não custa nada e não tem efeitos colaterais indesejados. Não desmotiva os demais - a menos que os receptores tenham o mau gosto de emoldurar suas cartas e pendurá-las acima de suas mesas. De modo geral, o quociente entre o esforço de escrever cartas (muito baixo) e o prazer em recebê-las (extraordinariamente alto) deve fazer da prática a técnica motivacional mais notável que existe.
Os leitores do blog parecem concordar: "Doug. Que 'post' inspirador! A energia positiva em notas escritas restitui a saúde do local de trabalho. Um retorno positivo genuíno levanta nossa integridade humana. Obrigado por compartilhar!", escreve uma pessoa. Mas, se essas notas são tão positivas para nossa integridade humana, por que o caso de Conant é tão atípico?
Parece haver três motivos. Primeiro, os executivos-chefes pensam que sua própria contribuição é mais valiosa que a dos outros e como ninguém lhes escreve cartas de agradecimento, então, eles não as escrevem para ninguém. Segundo, eles não são próximos o suficiente às atividades da empresa para saber quem merece agradecimento e, terceiro, eles esqueceram a curiosa verdade humana de que qualquer um faria quase qualquer coisa em troca de um simples tapinha nas costas.
Nas raras ocasiões em que gostariam de dizer obrigado, provavelmente não pegam uma caneta porque esqueceram como se segura uma ou pensam que vai demorar muito. Acabo de colocar isso à prova. Reconheço que o início foi vagaroso, já que tive de revirar o armário de material de escritório para conseguir o kit necessário. Mas depois disso não havia quem me parasse. Tirei a tampa da caneta e escrevi: "Lucy, que coluna inspirada! Ótima energia positiva! Obrigada por compartilhá-la." Coloquei-a em um envelope e escrevi meu nome na frente. Minha letra está meio irregular pelo desuso, mas ainda é legível. Tempo total despendido: 55 segundos.
Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times".

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