20111107

Apesar do desemprego alto, falta mão de obra nos EUA


Num país com 14 milhões de desempregados, a indústria aeroespacial de Seattle, no Estado de Washington, enfrenta dificuldades para preencher vagas. Não há operários especializados disponíveis na região, sobretudo mecânicos. O problema afeta também outras áreas industriais dos Estados Unidos, sugerindo que a crise de desempregos que atinge o país não se deve apenas ao fraco desempenho da economia.

"Não temos gente para fabricar coisas", afirmou ao Valor Laura Hopkins, diretora-executiva do Comitê Conjunto de Aprendizado Aeroespacial, uma iniciativa do governo do Estado de Washington para treinar mão de obra.

No caso de Seattle, região em que a Boeing tem duas grandes fábricas, faltam substitutos para os operários que estão se aposentando. As novas gerações preferiram fazer faculdade a aprender trabalhos manuais. Nos Estados Unidos como um todo, porém, há uma tendência ainda mais preocupante. Os trabalhadores estão perdendo qualificações profissionais devido ao longo período de desemprego.

Pelo dado mais recente, divulgado na sexta-feira, a taxa de desemprego nos Estados Unidos chegou a 9%, praticamente o dobro dos percentuais registrados antes da crise financeira, cujo pico foi em 2008. A projeção do Fed (Federal Reserve, o banco central americano) é que ela vai cair apenas lentamente. A taxa ficaria em cerca de 8,6% em fins de 2012, dificultando os planos de reeleição do presidente americano, Barack Obama. Em 2013, o desemprego recuaria para 8%.

É necessário criar cerca de 130 mil novos empregos por mês apenas para absorver os jovens que entram no mercado de trabalho, mas em outubro foram criadas apenas 80 mil vagas. "No ritmo atual, o desemprego não diminui nunca", afirmou Keith Hall, do Escritório de Estatísticas do Trabalho, em depoimento no Senado americano na sexta-feira.

O dado mais dramático, porém, é que 43% dos desempregados estão fora do mercado de trabalho há pelo menos seis meses. Entre os jovens, o índice de desemprego chega a 24%. O alijamento desse contigente do mercado de trabalho poderá causar um prejuízo permanente à economia americana, impedindo que a taxa de desemprego nos Estados Unidos volte aos patamares entre 4,5% e 5% observados antes da crise econômica.

Tradicionalmente, o setor manufatureiro é o que mais perde postos de trabalho nas recessões. Desta vez, porém, as indústrias estão se saindo relativamente bem, graças à sobretudo à desvalorização do dólar, que puxou as exportações. Foram criadas 170 mil vagas no setor nos último ano, embora o ritmo tenha esfriado um pouco nos últimos meses. "O simples fato de que temos algum crescimento no emprego industrial já é animador", afirmou Hall.

Há um ano, o governo Obama criou um programa para formar mão de obra para a indústria. Setores que exigem operários ultraqualificados, como o aeronáutico, são os que mais sofrem com a falta de mão de obra, mas não são os únicos. Uma pesquisa da Manpower Group, uma empresa de recursos humanos, mostra que 52% dos empregadores nos Estados Unidos enfrentam dificuldades para preencher vagas que exigem mais qualificação. Além de operários, faltam engenheiros. Nos últimos 20 anos, aumentou em 50% o número de diplomados nas universidades, mas a graduação de engenheiros ficou estagnada em 120 mil por ano no país.

Na Boeing, as contratações ganharam força nos dois últimos anos graças à recuperação da industria de aviação e ao lançamento do novo avião da companhia, o 787 Dreamliner. A Boeing tirou funcionários das empresas menores, que agora estão enfrentando dificuldades para preencher os postos vagos. "Uns 15 anos atrás, os trabalhadores saíam das fazendas conhecendo tratores e outros motores e tinham pelo menos uma noção de como as coisas funcionam", afirma Hopkins. "Hoje, eles não tem a menor ideia."

O alto desemprego também tem implicações para a política monetária. Se o desemprego é alto apenas porque as empresas não acham mão de obra qualificada, não vai adiantar nada o Fed adotar novas ações de estímulo monetário - elas tendem apenas a causar a aceleração da inflação.

As atas do Fed mostram um pouco das discussões - e visões distintas - sobre o tema durante as reuniões do seu comitê de política monetária. A leitura comum entre todos os membros do Fed é que a tanto a fraca demanda agregada quanto a falta de qualificações dos trabalhadores contribuem para o desemprego. A discordância é sobre o peso de cada um desses na taxa de desemprego.

Para a maior parte dos membros do Fed, a fraca demanda agregada é o principal fator por trás do desemprego. Um número menor de membros do Fed afirma que o problema central é estrutural, ligado à falta de mão de obra qualificada nas regiões onde há empregos disponíveis.

O presidente do Fed, Ben Bernanke, tem indicado que a causa principal do desemprego é a debilidade da demanda agregada. Mas ele reconhece que, à medida em que os trabalhadores ficam muito tempo sem emprego, a taxa estrutural de desemprego tendo a subir. Bernanke tem cobrado ações do governo para criar novos empregos já e, assim, evitar que a taxa de desemprego fique mais alta no futuro. Fonte Jornal Valor.

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